domingo, 28 de fevereiro de 2010

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos E não pensar. É correr as cortinas Da minha janela (mas ela não tem cortinas). Alberto Caeiro



Imagem Gustav Klimt


Devaneios 1/2 (a meio)

Nenhuma palavra, nem rima, nem verso

Nada tenho a escrever

Nada me vem a mente

Porém tudo me consome.


Quero continuar o exercício de gritar

De verso em prosa, o que sinto

Quero evitar o soslaio da vida

Quero encarar você de frente.


Porque o que importa vem

Tudo vem, de repente

É como a brisa que sem pedir licença

invade minha janela, sem continas.


Eu decidi, somente por essa fração de segundo

Não sintetizar, deixar fluir da vida

e o fruir do encontro, dos desencontros

de canto, para todo conto.


Neste mesmo instante decide também,

Não relativizar

As estrelas estão lá no céu, meus olhos crêem nisso.

O universo já é uma invenção.


Gosto da chuva, ela lava a alma

Sou amigo do vento, ele me traz notícias de "alémar"

Tenho uma relação de distancia com o mar, mas ele me enche os olhos

Por fim, sinto saudades do Sol, ele me aquece o coração.



Poemas inconjuntos

alberto caieiro

Não basta abrir a janela

Para ver os campos e o rio.

Nem é bastante não ser cego

Para ver as árvores e as flores.

É preciso também não ter filosofia nenhuma;

Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.

Há só cada um de nós, como uma chave.

Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;

E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,

Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

O espelho reflete certo; não erra porque não pensa.

Pensar é essencialmente errar.

Errar é essencialmente estar cego e surdo

O universo não é uma idéia minha.

A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha.

A noite não anoitece pelos meus olhos,

A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.

Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos

A noite anoitece concretamente

E o fulgor das estrelas existe se tivesse peso.

Quando tornar a vir a Primavera

Talvez já não me encontre no mundo.

Gostava agora de poder julgar que a Primavera é gente

Para poder supor que ela choraria,

Vendo que perdera o seu único amigo.

Mas a Primavera nem sequer é uma cousa:

É uma maneira de dizer.

É talvez o último dia da minha vida.

Saudei o sol, levantando a mão direita,

Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus,

Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

3 comentários:

  1. Rani,
    Apesar dos devaneios, sinto uma dose de realidade em suas palavras, de coisas que sugerem uma vontade de se expressar e fazer-se
    ouvir enquanto se contempla as coisas simples da vida, como a brisa, o mar e o calor do sol. Entre tantos pensamentos, um em especial
    chamou minha atenção: o de que não basta relativizar o que nos acontece, apenas aproveitar cada momento. Permita que a brisa, apesar de quase sempre quente, continue invadindo sua janela sem cortinas, e traga consigo toda a inspiração para novos devaneios.

    "Inventei um cavalo alado
    para meu próprio prazer,
    peguei carona com o vento
    e parti veloz pelo espaço sideral.
    Passei por nuvens de prata
    pequei uma estrela de ouro
    avistei objetos estranhos
    levei um ET na garupa.

    E vi as naves na lua
    mas a Lua ainda sem dono
    com o valente São Jorge
    sendo o seu guardião.
    Vi São Pedro o bom velhinho
    com sua túnica celeste
    agitado na porta do céu
    consultando o livro das almas...
    De um lado um monte de anjos
    (todos pareciam poetas)
    do outro os PCS e os Nayas
    fazendo chantagem pra entrar.

    Me parecia ver lá dentro
    serena a Virgem Maria
    adorando Jesus que entoava
    o " Cântico dos Cânticos"
    para uma legião de crianças
    todas iguais entre si
    e todas felizes de fato.

    Lá de cima eu contemplei
    a terra que me parecia
    tão pequenina e maldosa
    dentro de um mundo cristão.
    O poder nas mãos de ingratos
    crianças dormindo na rua
    velhinhos pedindo esmolas
    a violência prosperando
    e todos sem proteção...

    Voltei para a terra cansada
    da viagem feita de sonhos
    no " Paraiso Divino"
    da minha secreta ilusão.
    Deixei o ET nas alturas
    dei folga ao cavalo alado
    tranquei a porta do sonho
    e coloquei meus pés no chão." (D. Hilgenberg)

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  2. Caro,

    1/2 devaneio ou devaneio e 1/2? :-)
    mais um poema para seu livro, em breve pela Editora Senac, com lançamento simultâneo no Brasil e Australia (sua editora australiana, Ruth, aguarda ansiosamente pelo manuscrito:-)
    um ab
    Edu

    Ps- "A primavera é um tesão"(Wisnick)

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  3. Adoro a sensibilidade dos seus textos!
    Arrasa!
    Beijos
    Ana

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